PEDRO JUBILOT


 
Biografia

 

Pedro Jubilot   (Olhão, 1964)

 

 

~ Editou fanzines, webzines e outras folhas volantes. Em 2001 foi vencedor do concurso ‘Micro-contos de Natal’ do jornal ‘Público’ com «Visita». Em 2012-13, publicou mensalmente no ‘Cultura.Sul’ (Postal do Algarve) a colectânea «Contos na Ria Formosa». Em 2013 saiu com o seu livro «Postais da Costa Sul», que serviu de mote para a seguir criar a editora CanalSonora - uma pequena estrutura independente, sem fins lucrativos, que se centra na divulgação artística, essencialmente na escrita e na imagem. ~

 

 Bibliografia

 

Telegramas do Mediterrâneo (2016, CanalSonora)

Alma (2015, 4águas)

Postais da Costa Sul (2013, CanalSonora)

 
 



 

Textos

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Telegramas do Mediterrâneo (2016, CanalSonora)

 

| cacela velha, algarve. portugal       (telegrama nº1)                                                                                                                                                                                                    

 

| nesse abstracto arrebatamento me trago para um pouco de deleite na amurada junto à ria. daqui vejo o que ele viu, sinto o que ele sentiu ? atento, sereno, confiante ? só se não ouvir hoje o ruído de todos estes dias, ou então se me lembrar de como as coisas já foram simples

neste pedaço muito próprio que remanesceu de mediterrâneo aspira-se a um novo dia infinito. acima da praia, onde o mar se em-prata de lua ou se vai na-mouriscar, facilmente se encarna o inesgotável inebriamento de ibn darraj al-qastalli

só aqui se não deseja parar o tempo. e se acaso alguém souber de outro lugar assim de tão belo, poderá vir um dia trocar de morada comigo |

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Excerto de «Alma» (2015, 4águas)

 

A partir daqui as ruas começam a estreitar-se, a fechar-se a esse mundo novo crescente, abrindo-se a todo uma nova dimensão indefinida, mesmo para nós habituados às coisas da cidade grande. Embrenhamo-nos numa labiríntica rede de ruas e travessas, becos e pequenos largos. De chão agora mais sujo, em piso irregular. Onde pairam criaturas mais rudes, toscas e despudoradas. Logo ali um homem tombado no chão, dormindo o excesso de álcool. Cães escanzelados vadiam em busca de restos de comida. Uma mulher de aspecto pouco saudável imitando mal uma pose lasciva convida-nos a entrar numa casa. Duma outra porta aberta ouvimos o entoar de um canto. Não é fado como o de Lisboa, ainda que o faça lembrar. Soa estranho, áspero mas quente, talvez porque tem laivos musicais de flamenco e tonalidades vocais de cante berbere. Já noutra casa logo a seguir, fecham-se os postigos com força, à nossa passagem. Crianças esfarrapadas correm desunhadas escapulindo-se assim que dobram a próxima esquina. Reparamos então num vulto que passa ao fim da rua envolto por um manto negro que lhe oculta a cabeça e a face.

 

- Viste? Trajo misterioso e…atraente? Mas aquilo não é proibido?

- Acho que sim. Chama-se bioco. Mas concentra-te ao que viemos. Não fiques para aí a cismar nisso agora.

- Olha! Lá está o largo. E a taberna da velha. Portas verdes, serradura no chão, pingos por todo o lado, pipas, bancos de madeira já gasta expondo pregos ferrugentos. O típico balcão de pedra. Gatos que entram e saem entre um sono e outro. 

 

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Postais da Costa Sul (2013, CanalSonora)

 

 

~santa maria ~tavira                                                                                                                                   

 

~ durante algumas horas estarei aqui retido num dolente terraço, observando à volta o casario de telhados de tesoura, recortado sobre um rio que quase  ninguém por aqui sabe porque tem dois nomes, ou onde um acaba para o outro começar. fico remendando versos que também tu alinharias, se esti-vesses, nem que por um dia, num lugar como este. espreito a rua através das frestas da reixa das portas típicas da cidade. as pessoas que passam numa terna lentidão vão, entre parcas palavras, respirando desse ar impregnado de salmoura ~

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